Doenças Intersticiais Pulmonares
Introdução
A denominação, doença
intersticial pulmonar (DIP), é normalmente empregada para designar um grupo
numeroso e heterogêneo de patologias, caracterizadas pelo desenvolvimento de
infiltrados celulares, e/ou pela deposição de matriz extracelular, nos espaços
aéreos distais aos bronquíolos terminais. Como todos esses processos acometem
as mesmas regiões dos pulmões, eles adquirem características clínicas,
radiológicas e funcionais muito semelhantes, o que não só justifica a sua
inclusão num único grupo, como também explica as dificuldades envolvidas com os
seus diagnósticos específicos.
Estritamente falando, o
termo, interstício pulmonar, refere-se a regiões situadas entre elementos bem
definidos do pulmão. Assim, perifericamente, ele corresponde aos espaços
existentes entre as células endoteliais e o epitélio alveolar. Ele também
inclui os tecidos conectivos perivasculares, peribronquiolares e
peribronquiais, desde as paredes dos lóbulos secundários até as regiões mais
centrais. A denominação, doença intersticial, surgiu devido ao fato
de os primeiros casos de moléstias desse grupo terem sido reconhecidos apenas
em fases avançadas de sua evolução, quando mostravam acentuada deposição de
tecido fibroso no interstício periférico.Hoje, sabemos que mesmo tais casos de
fibrose pulmonar pura apresentaram, em sua fase inicial, um exuberante processo
inflamatório, não apenas no interstício, como também na luz alveolar. Devido à
grande variedade de estruturas anatômicas que podem estar acometidas nesses
processos, um nome mais adequado para o grupo seria “Doenças Infiltrativas
Difusas Pulmonares”, ou ainda “Doenças Pulmonares Parenquimatosas Difusas”.
Classicamente, as DIPs
englobavam os processos inflamatórios de caráter infiltrativo, com evolução
crônica ou subaguda, os quais, se não tratados, evoluiriam para insuficiência
respiratória grave, tendo como substrato anatomopatológico uma lesão terminal,
o “pulmão em favo de mel”. Mais modernamente, o conceito de DIP foi ampliado,
também sendo incluídas nesse grupo patologias de instalação aguda, tais como
toxicidade por drogas ou vasculites. Outro grupo de doenças, agora estudadas
nesse capítulo da Pneumologia, são as patologias bronquiolares do adulto
(bronquiolites), as quais frequentemente acometem, por contiguidade, os espaços
alveolares adjacentes.
Muito embora diversos
processos infecciosos ou neoplásicos pulmonares possam se apresentar,
radiologicamente, com infiltrados difusos de aspecto “ïntersticial”, tais
moléstias não são estudadas dentro do que se convencionou chamar de DIPs.
Consideradas moléstias
pulmonares raras, o número de casos de DIPs vem aumentando nos últimos anos. Em
parte, isso se deve ao seu maior reconhecimento por parte da comunidade médica.
Outro fator contribuinte seria o surgimento de novos agentes agressores
pulmonares, tais como medicamentos, agentes citotóxicos e, mesmo, possíveis
fatores ambientais.
Classificação
Existem mais de cento e
oitenta (180) doenças que podem ser englobadas no grupo das DIPs.
Tradicionalmente, tais moléstias são classificadas em dois grandes grupos: as
de etiologia conhecida e as de etiologia desconhecida (Tabela I). Embora as
primeiras sejam as mais numerosas, as últimas são mais frequentes na prática
clínica. Devido ao excessivo número de doenças, no presente artigo,
abordaremos, inicialmente, os aspectos gerais relacionados com o diagnóstico
diferencial dos diferentes processos. A seguir, concentrar-nos-emos em algumas
condições que consideramos de maior importância para o clínico.
Investigação
Diagnóstica
História
clínica e exame físico
A queixa principal de
pacientes com DIP costuma ser dispnéia, frequentemente presente, há meses ou
anos, que piora com a realização de atividades físicas, como andar longas
distâncias no plano ou subir escadas. Nos casos muito avançados, ela pode estar
presente durante a realização de atividades do cotidiano, como banhar-se ou
vestir-se. Tosse seca pode estar presente, mas expectoração abundante ou
sibilância não são características das DIPs. Muito importante é a obtenção de
um inquérito complementar minucioso, visando detectar sintomas de doenças com
manifestações sistêmicas, tais como colagenoses e sarcoidose.
A investigação do uso de
medicamentos e drogas potencialmente tóxicas, tanto no presente como no
passado, e de exposições ambientais profissionais ou domésticas, é de
fundamental importância para a detecção de quadros de toxicidade pulmonar,
pneumoconioses, pneumonites de hipersensibilidade, e outros.
Nesse contexto, não deve ser
esquecido o questionamento sobre atividades de lazer e a criação de animais, em
especial aves. Ao exame físico, o achado de baqueteamento digital, embora não
específico, é altamente sugestivo de fibrose pulmonar idiopática (FPI). À
ausculta, a presença de estertores finos profusos (em velcro ou em manguito)
sugere doença fibrótica avançada.
Radiografia
simples de tórax
Embora permita o diagnóstico
sindrômico da doença, é de pouca utilidade no diagnóstico diferencial entre os
diferentes processos. O reconhecimento do padrão radiológico predominante
(macro ou micronodular, alveolar, reticular ou cístico), e a distribuição
dessas lesões pode sugerir patologias específicas. Assim, infiltrados
reticulares difusos, predominando em bases e cursando com volumes pulmonares
reduzidos, costumam corresponder a FPI, ou comprometimento pulmonar por algumas
colagenoses. Já infiltrados micronodulares, acometendo ápices ou campos médios,
com volumes preservados e adenomegalia hilar, sugerem sarcoidose. Doenças
císticas, como granuloma eosinofílico (GE) e linfangioleiomiomatose (LAM),
habitualmente, cursam com hiperinsuflação pulmonar e uma maior incidência de
pneumotórax.
Tomografia
computadorizada de tórax de alta resolução (TCAR)
É um exame mais sensível e específico do que a
radiologia torácica convencional, capaz de detectar doença mesmo na presença de
radiografias normais. As imagens que a TCAR fornece podem ser comparadas à
visão que um observador atento teria, ao vasculhar, com o auxílio de uma lupa
de pequeno aumento, cortes transversais obtidos em diferentes níveis
pulmonares.
Assim, estruturas como o
lobo pulmonar secundário ficam mais evidentes, e padrões peculiares de
distribuição podem ser caracterizados. Algumas DIPs tendem a apresentar uma
distribuição de lesões centradas nos bronquíolos, como é o caso das
bronquiolites e do GE. Outros processos tendem a mostrar uma preferência pelo
acometimento linfático, como ocorre tipicamente com as linfangites
carcinomatosas e patologias granulomatosas.
Processos que tendem a evoluir para
fibrose intersticial e insuficiência respiratória progressiva, tal como a FPI,
mostram padrões predominantemente reticulares, com espessamento dos septos
interlobares, e localização predominantemente subpleural. Pela combinação dos
padrões de distribuição acima, tem-se chegado a quadros tomográficos bastante
específicos para algumas DIPs, o que poderá reduzir as indicações de biópsias pulmonares.
Pacientes com LAM, por exemplo, mostram inúmeros cistos de pequeno volume e
aspecto homogêneo, distribuídos uniformemente em ambos os pulmões. Casos de GE
costumam mostrar imagens císticas semelhantes, mas de distribuição
broncocêntrica e, preferencialmente, acometendo os ápices pulmonares.
Outra característica
importante da TCAR é a sua capacidade de fornecer informações sobre o grau de
inflamação e fibrose, existentes em um determinado caso. Admite-se, atualmente,
que a presença do padrão radiológico, conhecido como vidro despolido (ground
glass), guarde relação com lesões mais celulares, exsudativas e inflamatórias,
e, portanto, seja um marcador de doença inicial, com potencial para uma boa
resposta terapêutica.
Testes
de função pulmonar
Tais exames, habitualmente,
não contribuem de maneira significativa para o diagnóstico diferencial entre os
processos, mas são necessários para a avaliação da gravidade da doença, bem
como, ao serem repetidos periodicamente, na avaliação do grau de resposta ao
tratamento. A espirometria, associada a medidas do volume residual e da
capacidade de difusão do monóxido de carbono (DLCO), são os testes indicados.
Tipicamente são evidenciados
quadros de restrição pulmonar, muito embora defeitos ventilatórios obstrutivos,
às vezes, sejam notados, como, por exemplo, em alguns casos de sarcoidose e na
LAM. Os pacientes com DIPs, geralmente, apresentam hipoxemia arterial, por
vezes, de grau grave, que se acentua com a atividade física. Na sua gênese,
estão distúrbios da relação ventilação/perfusão e perturbações difusionais, as
quais costumam manifestar-se durante o exercício.
Os defeitos das trocas
gasosas são melhor estudados por meio de testes controlados, de exercícios
realizados em cicloergômetro ou esteira. Tais estudos, juntamente com o DLCO,
são considerados os métodos funcionais mais sensíveis para a detecção precoce
de DIPs.
Lavado
broncoalveolar (LBA)
A técnica da lavagem
broncoalveolar, através de fibrobroncoscópio encravado em um segmento brônquico
periférico, há anos vem sendo utilizada no estudo das DIPs. O procedimento,
normalmente, é feito pela injeção com seringas, através do canal do
broncoscópio, de repetidas alíquotas de soro fisiológico, até ser atingido um
volume final próximo a 200 ml.
Esse soro é prontamente
aspirado, sendo o material recuperado rico em elementos celulares e mediadores
inflamatórios, provenientes das porções mais distais dos pulmões. Esse material
é, então, submetido a estudos citológicos e avaliações bioquímicas diversas,
tais como dosagens de citoquinas. Em certas situações, esse procedimento pode
ser diagnóstico, poupando o paciente de uma biópsia pulmonar. Isso pode
ocorrer, por exemplo, nos casos de hemorragia alveolar, no achado de material
lipoproteináceo, em casos suspeitos de proteinose alveolar, na pesquisa de
inclusões citoplasmáticas por microscopia eletrônica no GE, ou na identificação
de gotículas de gordura no citoplasma de macrófagos, em pacientes com aspiração
crônica.
O LBA também apresenta
enorme importância na pesquisa de infecções, em especial por germes
oportunistas. Em se tratando de DIPs, contudo, na maioria das vezes, a
informação obtida é apenas acessória, em meio aos outros dados de investigação
diagnóstica. O uso do lavado tem definido relações entre alguns quadros
pulmonares e certos perfis de celularidade. Aumento de celularidade às custas
de neutrófilos e, eventualmente, de eosinófilos, costuma ser visto em casos de
FPI e quadros associados a colagenoses. Aumento da celularidade, às custas de
linfócitos, pode ser observado na sarcoidose e pneumonites de hipersensibilidade
(PH). Embora essas duas condições possam cursar com grandes elevações dos
linfócitos, habitualmente, a relação CD4/CD8 é elevada na primeira e reduzida
na última. Admite-se que a linfocitose no LBA de pacientes com sarcoidose
guarde relação com a atividade inflamatória da doença. Também se tem
demonstrado que as elevações das contagens linfocitárias, em pacientes com FPI,
se associam a maiores chances de resposta clínica ao tratamento com
corticosteróides. Embora seja um método valioso na pesquisa dos mecanismos
celulares e inflamatórios, envolvidos com a patogênese das doenças
intersticiais, o uso rotineiro do LBA, na condução clínica desses processos,
ainda não é consenso entre os diferentes autores.
Biópsias
transbrônquicas
O exame histopatológico do tecido
pulmonar é o método definitivo para o diagnóstico das DIPs. Biópsias
transbrônquicas são obtidas por meio de pinças apropriadas, durante a
realização de fibrobroncoscopias com os pacientes levemente sedados. Tais
pinças são direcionadas para a periferia do pulmão até ser encontrada
resistência. Nesse momento, sua extremidade cortante “em jacaré” é aberta, e
biopsia um pedaço da parede de um brônquio de pequeno calibre, trazendo consigo
o tecido alveolar adjascente. Apesar da sua praticidade, os fragmentos de
tecido obtidos com esse tipo de biópsia são pequenos, causando dificuldades de
interpretação para os patologistas. Idealmente, devem ser obtidas sete biópsias
transbrônquicas de bom tamanho, para que as chances de diagnóstico sejam
maiores. As biópsias transbrônquicas se revelam particularmente úteis em
patologias de distribuição peribrônquica ou linfática, e com características
histológicas bem definidas, como é o caso da sarcoidose, silicose e proteinose
alveolar. Esse tipo de biópsia também permite diagnosticar ou excluir a
presença de linfangite carcinomatosa e certos quadros infecciosos, como
tuberculose ou pneumocistose. Frequentemente, contudo, os achados histológicos
são inespecíficos, devido às pequenas dimensões dos fragmentos obtidos.
Biópsia
pulmonar cirúrgica
Estará sempre indicada,
quando os achados da biópsia transbrônquica forem inconclusivos, e o paciente
reunir condições clínicas adequadas para a cirurgia. Ultimamente, a abordagem
por minitoracotomia vem sendo substituída pela videotoracoscopia, a qual tem
reduzido em muito a morbidade do procedimento.
É recomendável a obtenção de
dois ou três fragmentos de pulmão, preferencialmente do lobo superior e
inferior do hemitórax abordado. O cirurgião poderá orientar a biópsia pelos
achados tomográficos, de tal modo que áreas com doença em fase inicial,
intermediária, e avançada sejam igualmente representadas nas amostras. A
obtenção de um volume expressivo de tecido, habitualmente, permite ao
patologista definir claramente o padrão histológico, bem como, particularmente,
nas doenças fibróticas, dar informações sobre o estadiamento do processo, em
função da quantidade relativa de inflamação e fibrose presentes. Portanto, tal
procedimento, além de fornecer um diagnóstico específico, nas doenças que
evoluem para fibrose, traz informações de natureza prognóstica, e das chances
de resposta ao tratamento. A patologia das DIPs é assunto complexo, o que é
agravado pela raridade dessas condições. Em função disso, tais biópsias devem
ser vistas por patologistas com experiência na área, preferencialmente, por um
bom patologista pulmonar.
Entidades
Específicas
Fibrose
Pulmonar Idiopática
Ao contrário do que o seu
nome possa sugerir, FPI é uma doença bem definida, com características
clínicas, radiológicas, funcionais e histopatológicas próprias. O termo
“idiopática” indica apenas que a sua etiologia é desconhecida. Curiosamente,
dados recentes mostram uma maior incidência da doença em indivíduos fumantes,
expostos a queima de lenha, ou relatando passado de trabalho com madeira. Na
sua gênese, já foram levantados fatores genéticos, infecções virais, e
processos inflamatórios autoimunes. De fato, é bem reconhecida uma forma
familiar da moléstia, mas os estudos genéticos, realizados nessa condição,
ainda não são conclusivos. A teoria mais aceita para o desenvolvimento da FPI
supõe que a ocorrência de insultos ambientais em indivíduos susceptíveis, tais
como hipotéticas infecções virais, ajam como agentes desencadeantes de uma
cascata inflamatória ao nível pulmonar. Tais agentes agressores, ao lesarem
tecidos e células pulmonares, desencadeariam uma resposta inflamatória aguda
que caracterizaria a fase inicial da doença, frequentemente chamada de
alveolite. Essa resposta, em condições fisiológicas, seria autolimitada, mas,
nos casos de FPI, perpetuar-se-ia num estado de cronicidade, devido a razões
desconhecidas, promovendo graves transtornos dos mecanismos de reparação
pulmonar. Histologicamente, tais distúrbios, habitualmente, se traduzem por um
aspecto de doença não uniforme, com áreas de pulmão normal coexistindo
adjacentes a áreas de inflamação, representadas por infiltrados linfocitários
septais, e a áreas de proliferação fibroblástica e deposição colágena. A medida
em que o processo avança, a intensa deposição de colágeno e o colápso dos
septos alveolares levam à formação de grandes espaços aéreos císticos,
delimitados por paredes fibrosas espessas e revestidos por epitélio metaplásico
bronquiolar. Esse último aspecto é chamado pulmão em favo de mel (honeycombing
lung) e representa a via final do processo. O padrão anatomopatológico descrito
acima corresponde à chamada “pneumonia intersticial usual” (em inglês UIP),
substrato histológico mais frequentemente associado a FPI, o qual também pode
ser encontrado em outras DIPs como, por exemplo, em casos de artrite reumatoide
ou esclerose sistêmica. Um segundo padrão histológico, que também pode estar
presente na FPI, é a chamada “pneumonia intersticial descamativa” (em inglês
DIP).
Clinicamente, a FPI acomete
pessoas de meia-idade, geralmente entre quarenta (40) e setenta (70) anos, com
uma discreta predileção por homens. A doença tem início insidioso e a queixa
principal é geralmente dispnéia. Embora alguns indivíduos queixem-se,
primeiramente, de tosse seca, todos os pacientes apresentarão dispnéia em
exercício, à medida em que a doença evolua. Ao exame físico, estertores finos
são o achado mais comum, e baqueteamento digital pode ocorrer em até 70% dos
casos. A radiografia de tórax costuma mostrar volume pulmonar reduzido, com um
infiltrado bilateral reticular ou reticulonodular. Tal infiltrado, normalmente,
é difuso, com predomínio nas bases pulmonares. Infiltrados reticulados
grosseiros, com imagens areolares múltiplas, costumam ser vistas em fases muito
avançadas da doença. A TCAR de tórax permite um estudo muito mais sensível e
detalhado dessas lesões. Através dela fica claro que os infiltrados na FPI
concentram-se, preferencialmente, nas regiões subpleurais. O envolvimento é
desigual, com áreas de reticulação alternando-se com áreas de tecido normal e
honeycombing. Outros achados encontrados são: 1) espessamento discreto e
irregularidades finas ao nível da interface pleura visceral - pulmões; 2)
aspecto de irregularidade fina na superfície dos vasos; 3) espessamento e
irregularidade do desenho das paredes brônquicas; 4) presença de
bronquiectasias de tração; 5) frequência variável de áreas em vidro despolido,
em meio às diversas alterações.
Pacientes com FPI,
geralmente, apresentam padrões espirométricos restritivos, com volumes e
capacidades pulmonares reduzidas. A ocorrência de fluxos expiratórios
supranormais se correlaciona com doença fibrótica avançada e é um indicador de
mal prognóstico. Quando existe história de tabagismo intenso associado, as alterações
funcionais podem ser menos típicas. Nessas situações, devido a lesões
enfisematosas superajuntadas, os volumes pulmonares tendem a ser preservados, o
DLCO atinge valores muito baixos, e a hipoxemia arterial é mais grave. Vale
ainda salientar que pacientes com FPI podem mostrar títulos elevados de fator
reumatóide e autoanticorpos não específicos, sem isso significar presença de
doença do colágeno.
O tratamento da FPI
baseia-se, inicialmente, na administração de prednisona, na dose de 1,0
mg/kg/dia. Nessas doses, são comuns efeitos colaterais importantes, tais como
intolerância à glicose, edemas, ganho de peso, epigastralgia e hipertensão
arterial. O médico que assiste ao doente deverá, portanto, estar atento para a
detecção e controle dessas complicações. Procura-se manter as altas doses de
esteróides por períodos de oito (8) a doze (12) semanas, momento no qual uma
reavaliação funcional é feita. Caso haja melhora ou estabilização
clínico-funcional, o esteróide é reduzido lenta e progressivamente, até que se
complete, pelo menos, um ano de tratamento. Na eventualidade de uma
deterioração em vigência de esteróides, costuma-se associar ciclofosfamida
oral, nas doses de 2 mg/kg/dia, ao mesmo tempo em que se reduz a prednisona
para doses em torno de 0,25 mg/kg/dia.
Embora costume ser melhor
tolerada que os esteróides, a ciclofosfamida é uma droga potencialmente mais tóxica,
podendo causar leucopenia, cistite hemorrágica, alopécia, plaquetopenia,
anemia, esterilidade e, a longo prazo, câncer.
Embora o curso clínico dos
casos de FPI possa ser variado, na maioria das vezes, a evolução não costuma ser
boa. A mortalidade, quatro anos após o diagnóstico, gira em torno de 50%, e
apenas 30% dos pacientes vão mostrar algum grau de resposta ao tratamento.
Admite-se que as chances de
sucesso terapêutico são maiores nos casos diagnosticados numa fase inicial, na
qual as alterações inflamatórias preponderem sobre as lesões fibróticas
irreversíveis. Isso enfatiza a necessidade do reconhecimento e tratamento precoce
dessa condição. Em casos selecionados de pacientes com insuficiência
respiratória grave, o transplante pulmonar se apresenta hoje como uma opção terapêutica
viável.
Sarcoidose
A sarcoidose é uma doença
multissistêmica, de etiologia desconhecida, caracterizada, histologicamente, pelo
achado de granulomas epitelióides não caseosos, os quais, muito frequentemente,
acometem os pulmões e/ou linfonodos torácicos. Os pulmões, geralmente, estão
envolvidos microscopicamente, mesmo quando as radiografias de tórax são
normais. O aspecto anatomopatológico mostra granulomas não necrotizantes, com
tendência a se coalescerem, distribuindo-se ao longo das vias linfáticas na
pleura, septos interlobulares, e ao longo dos feixes broncovasculares.
Uma quantidade pequena de
degeneração ou necrose fibrinóide comumente é encontrada em granulomas
sarcoidóticos típicos. Na maioria das vezes, também está presente um infiltrado
intersticial mononuclear discreto.
A sarcoidose costuma
acometer pessoas entre a segunda e quarta décadas de vida, sem predileção por
sexo, mas com formas de apresentação mais floridas e agressivas em indivíduos
da raça negra. As queixas respiratórias podem ser muito pobres, não raro a
doença sendo diagnosticada devido a um achado radiológico. Nas formas mais
avançadas de comprometimento pulmonar, a queixa mais comum é dispneia
relacionada ao exercício. O exame do tórax costuma ser pobre, sendo encontrados
estertores finos nos casos de evolução para fibrose. Sibilos e broncoespasmo
podem surgir, quando houver estreitamento brônquico, secundário ao crescimento
de granulomas ao nível submucoso. Segundo James(1), dor do tipo pleural,
derrame pleural, e baqueteamento digital são achados tão infrequentes, que a
presença de um deles significa alta probabilidade de outro diagnóstico. Todo
paciente com suspeita de sarcoidose deve ser minuciosamente examinado, devido à
possibilidade de manifestações extratorácicas da doença.
Radiologicamente, a
sarcoidose pode ter apresentação variada. Em suas fases iniciais, costuma
mostrar infiltrados simétricos de predomínio nodular ou micronodular, às vezes
associados a um aspecto de opacificação tênue, em vidro despolido. Tais
infiltrados têm uma tendência a acometer mais os campos médios e os terços
superiores dos pulmões. Adenomegalias hilares e mediastinais são achados frequentes.
Em fases mais avançadas, infiltrados reticulares predominam, e imagens em favo
de mel também podem ser distinguidas. Nesses casos, o comprometimento pulmonar
pode ser difuso, associado a volumes pulmonares pequenos, lembrando FPI. Vale
salientar que alguns casos crônicos de sarcoidose podem mostrar predomínio
apical, nódulos confluentes e imagens cavitárias, simulando, assim, tuberculose
pulmonar.
É habitual estagiar a
sarcoidose torácica em função dos seus achados radiológicos. Tal classificação
pressupõe que exista uma progressão contínua entre os diferentes estágios, o
que nem sempre ocorre. A TCAR permite evidenciar mais facilmente as adenopatias
mediastinais. Além disso, ela costuma mostrar um padrão muito típico, com
lesões nodulares múltiplas, distribuindo-se em áreas de projeção linfática,
tais como regiões subpleurais e peribroncovasculares. Esse último tipo de
distribuição explica porque biópsias transbrônquicas são um método bastante
efetivo no diagnótico dessa condição.
Pacientes com sarcoidose
tipicamente apresentam depressão da imunidade celular e uma hiper-reatividade
da imunidade humoral. Tais fenômenos são traduzidos, laboratorialmente, por uma
anergia a antígenos cutâneos tais como o PPD, hipergamaglobulinemia, e um nível
elevado de imunocomplexos circulantes. A injeção intradérmica de extrato obtido
de baço ou linfonodos de paciente sarcoidótico provoca o surgimento de lesões
granulomatosas típicas na pele de um outro portador da moléstia, quatro semanas
após a administração. Tal teste é chamado reação de Kveim e é preconizado como
método diagnóstico auxiliar da doença. A falta de antígenos adequadamente
padronizados e comercializados, entretanto, impede o seu uso rotineiro.
Pacientes com sarcoidose podem mostrar aumento dos níveis séricos da enzima
conversora da angiotensina, muito embora outras patologias granulomatosas
também possam cursar com tais elevações. Hipercalcemia e hipercalciúria são
achados frequentes, devido à absorção intestinal excessiva, secundária à
hiperprodução de 1,25 dihidroxi - vitamina D, pelas células dos granulomas
epitelióides.
O curso e prognóstico da
sarcoidose correlacionam-se com seu modo de apresentação. Um início agudo,
caracterizado por febre alta e eritema nodoso, costuma ter evolução
autolimitada com regressão espontânea. Uma doença de instalação insidiosa tem
maiores chances de evoluir para fibrose pulmonar irreversível e insuficiência
respiratória grave. A presença de comprometimento extratorácico, incluindo
hipercalcemia ou hipercalciúria, é indicação indiscutível para tratamento.
Quadros de artrite ou eritema nodoso podem ser controlados apenas com
antiinflamatórios não hormonais. Em todas as demais situações, a terapêutica de
escolha são os corticosteroides em altas doses. A maioria dos autores,
atualmente, concorda que doentes em estádio I, sem sintomas ou manifestações
extratorácicas, devam apenas ser seguidos clinicamente com radiografias
semestrais.
Pacientes em estádio II, com sintomas ou alterações em provas de
função pulmonar, devem ser tratados. Pacientes em estádio II, assintomáticos e
sem alteração funcional, poderão ser observados de perto e reavaliados após um
período de três a seis meses, devido à possibilidade de regressão espontânea. Muitas
autoridades, porém, preconizam o tratamento medicamentoso imediato, em tais
casos. Pacientes em estádio III e IV sempre deverão ser tratados. O esteróide
utilizado normalmente é a prednisona, em doses orais iniciais variando entre 40
e 60 mg ao dia. Essas doses deverão ser mantidas por um período de quatro (4) a
oito (8) semanas e, progressivamente, decrescidas em função da resposta
clínica. O tempo total de tratamento é variável, podendo ir de seis (6) a doze
(12) meses.
Nos casos em que os
esteróides falham, ou não possam ser usados, são opções terapêuticas
alternativas o metotrexate, azatioprina, ciclofosfamida, clorambucil e
cloroquina.
Pneumonites
de Hipersensibilidade
O termo pneumonite de
hipersensibilidade designa um grupo de doenças resultantes da inalação repetida
e da sensibilização a um grande número de partículas orgânicas. Menos frequentemente,
essa sensibilização se dá a inalantes químicos de baixo peso molecular. Também
conhecida como alveolite alérgica extrínseca, a importância dessa moléstia
reside no fato de, uma vez identificado e afastado o agente causador, ela poder
estabilizar-se ou reverter totalmente. A lista de agentes que podem causar PH é
extensa, e uma pequena amostra delas está contida na Tabela IV. O diagnóstico
de PH depende, principalmente, de um apurado senso clínico. Uma história bem
feita, que sugira uma relação temporal entre os sintomas e certas atividades
profissionais ou passatempos, frequentemente é a melhor pista para se chegar ao
diagnóstico. A história ambiental deve-se estender ao ambiente doméstico,
indagando-se sobre a presença de umidade, vazamentos, bolor, e criação de
animais. Classicamente, a PH é dividida em aguda e crônica. Na primeira,
sintomas, tais como febre, fraqueza, dores musculares, tosse, dispnéia e aperto
no peito, aparecem quatro a doze horas após a exposição ao agente, como, por
exemplo, feno mofado. Ao exame físico, febre e estertores finos podem ser
evidenciados. A forma aguda costuma ser autolimitada, os sintomas desaparecendo
vinte e quatro (24) horas após o seu início, até o momento em que uma nova
exposição ocorra. A forma crônica, normalmente, se associa às maiores
dificuldades diagnósticas. Dispnéia ao exercício e tosse seca são os sintomas
predominantes. Cansaço e perda de peso também podem estar presentes.
O exame físico pode ser
normal ou evidenciar estertores difusos. Sibilos têm sido descritos em alguns
pacientes, e um tipo particular de som respiratório, denominado grasnido, é
particularmente sugestivo de PH. O pulmão dos criadores de pássaros, em
particular, costuma ter evolução silenciosa, não raro sendo diagnosticado
apenas em fases avançadas de insuficiência respiratória.
A radiografia de tórax, nas
formas agudas de PH, pode ser normal, mas, tipicamente, mostra nódulos
micronodulares, disseminados ou de predomínio basal. Infiltrados, em vidro
despolido, difusos, também podem estar presentes. Nas formas crônicas,
infiltrados reticulares, disseminados acometem ambos os pulmões. Os volumes
pulmonares podem estar mantidos ou diminuídos, e existe uma tendência para o
acometimento ser maior em lobos superiores. A TCAR, nessa fase, costuma mostrar
áreas de densidades lineares e faveolamento, simulando FPI. Contudo, a
associação de nódulos centrilobulares, em profusão variável, e áreas de vidro
despolido com distribuição desigual, falam a favor de PH crônica.
O diagnóstico de PH,
geralmente, é confirmado por biópsia cirúrgica. Histologicamente, os achados
são de uma bronquiolite celular, associada a um infiltrado intersticial
mononuclear e a alguns granulomas. Tais granulomas costumam ser pequenos e
frequentemente malformados, mostrando-se mais como um acúmulo frouxo de células
epitelióides. Alguns casos podem mostrar áreas de bronquiolite obliterante e
pneumonia em organização (em inglês BOOP) associadas. Em casos crônicos, um
padrão tipo UIP, indistinguível da FPI, já foi descrito.
O tratamento da PH
baseia-se, primordialmente, na detecção e afastamento do antígeno causador do
processo, objetivo que nem sempre é facilmente atingido. A terapia
medicamentosa baseia-se no uso de prednisona, inicialmente, em altas doses, com
redução progressiva do medicamento em função da resposta obtida. O curso
clínico dos casos de PH é variável, mas o prognóstico costuma ser bom, desde
que a doença seja detectada em fase não muito avançada.
AUTOR: José Antônio Baddini
Martinez
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