Oxigenioterapia dispositivos utilizados
“A hipóxia é danosa para o
organismo. Em uma situação de emergência, a determinação da causa da disfunção
respiratória pode ser impossível e até mesmo desnecessária antes do início de
algumas das operações do manejo emergencial das vias aéreas. A oxigenoterapia
deve ser instituída emergencialmente” (Carvalho WB., 2006).
Objetivos
gerais e clínicos
1. Manutenção da oxigenação
tecidual adequada.
2. Correção da hipoxemia
aguda pela elevação dos níveis alveolar e sanguíneo de oxigênio.
3. Redução dos sintomas
associados à hipoxemia crônica, podendo também melhorar a função mental.
4. Redução da carga de
trabalho que a hipoxemia impõe no sistema cardiopulmonar.
Liberação
de oxigênio
A liberação de O2 tecidual
depende de:
• débito cardíaco (DC) e da
distribuição de O2 pelo organismo;
• grau de vasoconstrição
arterial;
• fatores que alteram a
curva de dissociação da hemoglobina.
A eficiente oxigenação
depende também de:
• adequada ventilação
alveolar;
• adequada relação
ventilação-perfusão (V/Q);
• ausência de shunts
direita-esquerda.
O transporte gasoso ocorre
no plasma (2%) e na hemoglobina (98%), e depende de um DC adequado. Sabe-se que
aproximadamente 1 molécula de hemoglobina carreia 4 moléculas de oxigênio (ou
13 mL). Alguns fatores podem alterar a curva de dissociação da oxi-hemoglobina,
tais como:
1. Desvio para a direita:
diminui a afi nidade da hemoglobina com o oxigênio, portanto, tem-se aumento de
temperatura, de PCO2, de H+ e de 2,3-difosfoglicerato (DPG).
2. Desvio para a esquerda:
aumenta a afinidade da hemoglobina com o oxigênio, portanto, tem-se diminuição
de temperatura, de PCO2, de H+ e de 2,3-DPG.
Sabe-se que como o neonato
tem hemoglobina fetal circulante (HbF) até aproximadamente 6 meses, ele
“carrega” grande quantidade de oxigênio aos tecidos, o que mantém uma SatO2 !
97% e uma PO2 igual a 50 a 70 mmHg.
Avaliação
da necessidade de oxigenoterapia
Existem 3 formas básicas
para determinar a necessidade de oxigenoterapia:
• mensurações laboratoriais
para confirmar a hipoxemia: gasometria;
• doença e condições
clínicas;
• avaliação à beira do
leito: sinais de desconforto respiratório.
Tabela 1 Sinais clínicos de
hipóxia
Achados
|
Leve a moderada
|
Grave
|
Respiratórios
|
Taquipneia
Dispneia
Palidez
|
Taquipneia
Dispneia
Cianose
|
Cardiovasculares
|
Taquicardia
Hipertensão
leve e vasoconstrição periférica
|
Taquicardia,
bradicardia e eventuais arritmias
Hipertensão
e hipotensão eventual
|
Neurológicos
|
Agitação
Desorientação
Cefaleias
Desinteresse
|
Sonolência
Confusão
Visão
borrada
Visão
tubular
Perda
da coordenação
Comprometimento
do julgamento
Tempo
de reação lento
Atividade
maníaco-depressiva
Coma
Baqueteamento
|
Indicações
1. Hipoxemia comprovada:
• crianças > 28 dias:
PaO2 < 60 mmHg ou SatO2 < 90%;
• neonatos: PaO2 < 50
mmHg ou SatO2 < 88% (por causa da HbF).
2. Situações agudas em que
há suspeita de hipoxemia.
3. Traumatismo grave.
4. Infarto agudo do
miocárdio (IAM).
5. Terapia de curto prazo
(p.ex.: recuperação pós-anestésica [RPA]).
Contraindicações
Não existe nenhuma
contraindicação absoluta.
Precauções
e/ou possíveis complicações
1. PaO2 > 60 mmHg: pode
deprimir a ventilação em alguns pacientes com hipercapnia crônica.
2. Fração inspirada de
oxigênio (FiO2) > 0,5: pode causar atelectasia, intoxicação por O2 e/ou
depressão ciliar ou leucocitária.
3. PaO2 > 80 mmHg nos
recém-nascidos pré-termos (RNPT): pode causar retinopatia da prematuridade.
4. Aumento da PaO2 nos
lactentes cardiopatas: pode fechar ou contrair o canal arterial.
5. Diminuição da FiO2
durante a broncoscopia: evita a ignição intratraqueal.
6. Aumento da FiO2: aumenta
o risco de incêndio.
7. Pode ocorrer contaminação
bacteriana quando são utilizados nebulizadores ou umidificadores.
Monitoração
1. Avaliação clínica
incluindo condições cardíaca, neurológica e pulmonar.
2. Avaliação dos parâmetros
fisiológicos (PaO2 e SatO2), em conjunção com o início da terapia, ou:
• dentro das 12 horas
iniciais com FiO2 ! 0,4;
• dentro das 8 horas
iniciais com FiO2 ! 0,4;
• dentro das 72 horas
iniciais do IAM;
• dentro das 2 horas
iniciais de qualquer pneumopatia;
• dentro da primeira hora de
vida do neonato.
Verificação
dos equipamentos
1. Todos os sistemas de
liberação de O2 devem ser checados pelo menos 1 vez/dia.
2. Checagens mais frequentes
são necessárias nos sistemas:
• suscetíveis à variação da
FiO2;
• aplicados em pacientes com
via aérea artificial;
• liberando uma mistura
gasosa aquecida;
• aplicados em pacientes
clinicamente instáveis ou que necessitam de FiO2 ! 0,5.
Toxicidade
do oxigênio
1. Afeta sobretudo os
pulmões e o sistema nervoso central (SNC).
2. Dois fatores principais
determinam os efeitos nocivos do O2: PO2 e o tempo de exposição.
3. Os efeitos neurológicos
centrais incluem tremores, contrações e convulsões.
Tabela
2 Respostas fisiológicas à exposição a 100% de o2 inspirado
Tempo
de exposição
|
Resposta
fisiológica
|
0
a 12 horas
|
Função
pulmonar normal
Traqueobronquite
Dor
torácica subesternal
|
13
a 24 horas
|
↓
da capacidade vital
|
25
a 30 horas
|
↓
da complacência pulmonar
↓
da PO2 no exercício
↑
da P(A-a)O2
|
31
a 72 horas
|
↓
da capacidade de difusão
|
Fonte: adaptado de
Jenkinson, 1983.
Broncopneumonia
O paciente exposto a uma
PaO2 elevada durante um período prolongado apresenta sinais similares de broncopneumonia
(BCP). Aparecem infiltrados irregulares na radiografia, mais proeminentes nos
campos pulmonares inferiores.
Depressão
da ventilação
A supressão do estímulo
hipóxico faz alguns pneumopatas hipoventilarem ao receber oxigênio. Nesses
pacientes, a resposta normal às PCO2 elevadas é atenuada, sendo a falta de O2
(detectada pelos quimiorreceptores periféricos) o estímulo principal da
respiração. A elevação dos níveis sanguíneos de O2 nesses pacientes suprime os
quimiorreceptores periféricos e, consequentemente, deprime o estímulo
ventilatório e eleva a PCO2. Níveis elevados de O2 no sangue também podem
romper o equilíbrio V/Q normal, acarretando um aumento da PaCO2. O fato da
oxigenoterapia fazer alguns indivíduos hipoventilarem nunca deve impedir a
administração do O2. A prevenção da hipóxia deve ser sempre a primeira
prioridade.
Atelectasia
de absorção
A atelectasia sobrevém em
razão de um processo de difusão gasosa desencadeado pelo oxigênio. A pressão
total do gás bloqueado na parte distal da obstrução está próxima de 760 mmHg,
ao passo que a soma das pressões parciais do gás, no sangue venoso misturado,
que se apresenta na interface alveolar, é inferior a 760 mmHg em razão de uma
pressão parcial fraca de oxigênio no sangue venoso.
O equilíbrio das pressões
parciais acontece pela difusão dos gases alveolares para o sangue. O alvéolo
diminui o volume correspondente à quantidade de oxigênio absorvido. A pressão
dos demais gases alveolares é mantida em seus níveis atmosféricos, isto é , no
caso do CO2, um gradiente venoso-alveolar de 40 a 45 mmHg, e do nitrogênio, um
gradiente nulo (573 – 573: 0). De fato, a queda de O2 no alvéolo supera o
aumento da taxa de CO2 de tal maneira que a soma das pressões parciais no
sangue venoso será consideravelmente inferior à pressão atmosférica. Essa
diferença de pressão alcançada (60 mmHg) explica a continuidade da difusão do
gás, o que reduz ainda mais o volume alveolar até o colapso completo. Ver
Figura 1.
Figura 1 Atelectasia por
absorção. Fonte: West, 1995.
Dispositivos:
sistemas de liberação
Existem
4 modelos básicos:
1. Sistemas de baixo fluxo.
2. Sistemas de alto fluxo.
3. Sistemas com
reservatório.
4. Cercados.
São importantes as seguintes
perguntas para a indicação dos sistemas:
1. Sabe-se quanto de O2 é
liberado pelo sistema?
2. A FiO2 liberada é fixa ou
varia de acordo com as alterações da demanda do paciente?
Existem diferenças entre os
sistemas de liberação de oxigênio:
1. Baixo fluxo: o fluxo
inspiratório do paciente frequentemente ultrapassa o liberado pelo dispositivo,
resultando em uma diluição aérea (área sombreada). Além disso, quanto maior o
fluxo, maior a quantidade de ar inspirada e menor a FiO2.
2. Alto fluxo: sempre excede
o fluxo do paciente e, por essa razão, a FiO2 é fi xa.
3. Com reservatório: também
obtém-se uma FiO2 fixa; este sistema armazena um volume (fluxo ! tempo) que é
maior ou igual ao VC do paciente.
Aplicação
Sabe-se que no ar do
ambiente existem: nitrogênio + oxigênio + argônio + gás carbônico. Para que
seja calculado um valor aproximado da FiO2, podem ser utilizadas as seguintes
fórmulas:
Lembrando que na relação
correta para os dispositivos que utilizam ar comprimido e oxigênio, deve-se
utilizar uma proporção maior de ar comprimido do que de oxigênio (exatamente
para evitar a toxicidade do O2).
Sistemas
de baixo fluxo
Esses sistemas fornecem O2
suplementar com até 8 L/min, sempre diluí do no ar atmosférico: a FiO2 é baixa
e variável. Cânula nasal, cateter nasal e cateter nasotraqueal são os tipos de
sistema de baixo fluxo descritos a seguir.
Cânula
nasal
• Adultos: fluxo de 1 a 8
L/min;
• lactentes: fluxo < 2
L/min;
• FiO2 variável;
• vantagens: fácil
utilização, descartável, barata e bem tolerada;
• desvantagens: instável,
fácil de deslocar, causa ressecamento das mucosas e presença de pólipos e desvios
de septo bloqueiam o fluxo;
• melhor uso: domiciliar,
terapia prolongada, FiO2 baixa e em paciente estável.
Figura 2 Cânula nasal.
Cateter
nasal
• Conectado ao umidificador;
• adultos: fluxo de 1 a 8
L/min;
• lactentes: não é
utilizado;
• FiO2 variável;
• vantagens: boa
estabilidade, descartável e barato;
• desvantagens: difícil
colocação; necessita de troca regular; pode provocar reflexo de vômito,
deglutição de ar e aspiração; e presença de pólipos e desvios de septo que
bloqueiam o fluxo;
• melhor uso: broncoscopia e
terapia prolongada.
Figura 3 Cateter nasal.
Cateter
transtraqueal
• Conectado ao umidificador;
• adultos: fluxo de 1 a 4
L/min;
• lactentes: não é
utilizado;
• FiO2 variável;
• vantagens: menor
utilização e elimina a irritação nasal;
• desvantagens: custo
elevado, complicações cirúrgicas, infecções e rolhas;
• melhor uso: terapia
prolongada e quando não há aceitação do O2 nasal.
Figura 4 Cateter
transtraqueal.
Sistemas
com reservatório
Incorporam um mecanismo de
coleta e armazenamento de O2 entre as inspirações do paciente. Fornecem FiO2
comparável à dos sistemas sem reservatório, mas com fluxos menores. Cânula com
reservatório, máscara simples, máscara de reinalação parcial e máscara de não
reinalação são os tipos de sistema com reservatório descritos abaixo.
Cânula com reservatório
(Figura 5)
• Fluxo de 1 a 4 L/min;
• FiO2 variável;
• vantagens: menor utilização,
menor custo, elimina a irritação nasal, aumenta a tolerância ao exercício e
aumenta a mobilidade;
• desvantagens:
desagradável; incômoda e o padrão respiratório afeta o desempenho;
• melhor uso: tratamento
domiciliar e para pacientes que necessitam de maior mobilidade.
Figura 5 Cânula com
reservatório.
Máscara simples
• Fluxo de 5 a 12 L/min;
• FiO2 variável;
• vantagens: de rápida e
fácil colocação, barata e descartável;
• desvantagens:
desconfortável, deve ser removida para a alimentação e bloqueia o vômito de
pacientes inconscientes;
• melhor uso: emergências e
terapia de curto prazo.
Figura 6 Máscara simples.
Máscara
de reinalação parcial e de não reinalação
• Fluxo de 6 a 10 L/min;
• FiO2 variável;
• vantagens: de rápida e
fácil colocação, barata e descartável;
• desvantagens:
desconfortável, deve ser removida para a alimentação, bloqueia o vômito de
pacientes inconscientes e há risco potencial de sufocação;
• melhor uso: emergências e
terapia de curto prazo.
Figura 7 Máscara de
reinalação parcial e de não reinalação.
Sistemas
de alto fluxo
Fornecem uma determinada
concentração de O2 em fluxos iguais ou superiores ao fluxo inspiratório máximo
do paciente. A máscara de Venturi é o tipo de sistema de alto fluxo descrito a
seguir (Figura 8):
• fluxo variado;
• FiO2 fixa;
• vantagens: de fácil
colocação, FiO2 estável e precisa;
Figura 8 Máscara de Venturi
(arrastamento de ar).
• desvantagens:
desconfortável, barulhenta, deve ser retirada para alimentação
e a FiO2 varia com a pressão
retrógrada;
• melhor uso: em pacientes
instáveis que necessitam de FiO2 baixa e precisa.
Sistemas
de dois gases (ar comprimido e oxigênio)
Colocar o paciente em um
ambiente fechado com O2 atmosférico controlado é uma das formas mais antigas de
oxigenoterapia. Atualmente, os sistemas de 2 gases são muito utilizados nos
lactentes, por meio de incubadoras, tendas e halos ou capacetes.
Incubadoras
• Fluxo de 8 a 15 L/min;
• FiO2 variável;
• vantagens: fornecem
controle de temperatura;
Figura 9 Incubadora
• desvantagens: caras,
incômodas, de difícil higienização, limitam a mobilidade do recém-nascido (RN)
e há risco de incêndio;
• melhor uso: em lactentes
que necessitam de suplementação de O2 e regulação térmica precisa.
Tendas
• Fluxo de 12 a 15 L/min;
• FiO2 variável;
• vantagens: fornecem
aerossolterapia concomitante;
• desvantagens: caras,
incômodas, provocam um fl uxo de ar turbulento, de difícil higienização,
limitam a mobilidade do RN e há risco de incêndio;
• melhor uso: em crianças
pequenas que necessitam de baixa a moderada FiO2 e de aerossol.
Figura 10 Tenda.
Halos
ou capacetes
• Fluxo ! 7 L/min;
• FiO2 fixa;
• vantagens: grande variação
de FiO2; é mais fi siológico que a tenda, por proporcionar um fluxo de ar
helicoidal;
• desvantagens: de difícil
higienização;
• melhor uso: em lactentes
que necessitam de suplementação de O2.
Figura 11 Halo ou capacete.
Conclusão
A prevenção da hipóxia deve
ser sempre prioridade. Ao selecionar ou recomendar algum sistema de liberação
de oxigênio, devem ser considerados os 3 “Ps”: o propósito, o paciente e a
performance.
Bibliografia
1. American Academy of
Pediatrics (AAP), 2000. Suporte avançado de vida em pediatria. AAP, 2000.
2. American College of
Emergency Physicians, American Academy of Pediatrics. APLS - Curso de
emergência pediátrica. Strange GR (ed.). 3.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2001.
3. Carvalho WB. Tratado de
terapia intensiva pediátrica. 2.ed. Atheneu, 2006.
4. Hospital Israelita Albert
Einstein e Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo. Manual de normas de terapia intensiva pediátrica. 1.ed. São Paulo:
Sarvier, 1998. v.1.
Autoras:
Aretusa Koutsohristos, Juliana Gamo Storni
Obrigada pelas informações sobre carboxiterapia belo horizonte
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